Obrigado, Rapazes
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Crítica

Obrigado, Rapazes

3/5 estrelas

O remake italiano de ‘Um Triunfo’ consegue voltar a contar bem a história de um actor na mó de baixo que vai dar aulas de teatro a um grupo de presidiários.

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A Time Out diz

Tudo começou em 1985, quando o actor e encenador sueco Jan Jönson foi fazer um workshop de teatro com um grupo de presos de uma cadeia de alta segurança do seu país, para os formar como actores e levar à cena À Espera de Godot, de Samuel Beckett. No dia da estreia da peça em Gotemburgo, cinco dos seis detidos que formavam o grupo optaram por fugir em vez de subirem à cena. Em 2020, o francês Emmanuel Courcol escreveu e realizou Um Triunfo, inspirado na história de Jönson e dos seus prisioneiros/actores, com Kad Merad no papel principal. O filme foi um bom sucesso de público e de crítica, e entre outras recompensas recebeu o galardão de Melhor Comédia Europeia nos Prémios do Cinema Europeu.

Em vez de um (muito possível) remake americano, surge agora Obrigado, Rapazes, a versão italiana de Um Triunfo, com realização de Riccardo Milani e Antonio Albanese na figura do actor e encenador. Obrigado, Rapazes segue de muito perto a fita original de Emmanuel Courcol, fazendo algumas pequenas alterações ao enredo e acrescentando-lhe um temperozinho de comédia transalpina, particularmente na caracterização das personagens, e que nos enche de nostalgia dos tempos em que era do cinema italiano que saíam algumas das melhores comédias feitas na Europa, que se mediam mesmo com as americanas. 

Albanese é Antonio, um actor tão na mó de baixo que está reduzido a dobrar filmes pornográficos, ao qual um colega e velho amigo oferece um trabalho inesperado: ser professor de representação num estabelecimento prisional. A princípio céptico, Antonio acaba por se entusiasmar com o desafio: não só dar aulas de representação como também encenar À Espera de Godot com a mão-cheia de detidos que aparece para frequentar as aulas, quase todos completamente à nora em relação ao que fazem ali. Eles vão desde o bastante confuso Damiano, que ainda por cima gagueja, até ao perigoso Diego, que manda lá dentro e que, como não conseguiu um papel na peça, “convence” um dos membros do elenco a desistir e a ceder-lhe a sua personagem.

Tal como o original francês, Obrigado, Rapazes tem ingenuidades, e uma forte componente de filme feel good e “inspirador” (os sucessivos obstáculos quer institucionais, quer de trabalho com pessoas que nunca subiram a um palco na vida e ainda por cima estão a cumprir pena numa prisão, que Antonio consegue ultrapassar à força de insistência, dedicação e paixão pelo seu ofício). Mas Obrigado, Rapazes revela também um bom trabalho por parte de Riccardo Milani na gestão dos elementos de comédia e de drama com entrelinhas “sociais” da história, ma non troppo, nunca soletradas para o espectador as captar, e evitando desequilíbrios no registo do filme.

O resto é feito pelos actores. Ricardo Albanese personifica, entre o cómico e o comovente, um Antonio cada vez mais entusiasmado e convicto da sua capacidade de montar a peça e de, com desta, dar aos seus actores o presente de os tirar por alguns momentos da prisão e os apresentar, em palco, a um mundo que eles nunca imaginaram que existia e onde revelam talentos que nunca pensaram ter; e os intérpretes dos cinco presos, encabeçados por Vinicio Marchioni em Diego, mostram um robusto labor de colectivo a fazê-los transitar da dúvida, da galhofa e de uma atitude recalcitrante, para um interesse gradual e uma dedicação autêntica aos seus respectivos papéis, e ao espectáculo.

O filme faz um paralelo explícito – mas que, neste caso, nem por isso deixa de ser pertinente – entre o absurdo intrínseco à peça de Beckett, em que as personagem esperam por alguém que nunca chegará (e talvez nem exista), e a condição do grupo de presidiários, que esperam por uma liberdade que, de tão longínqua ou improvável, parece que também jamais virá. Mas a palavra final vem do próprio autor de À Espera de Godot. Quando, em 1985, foi informado do que tinha acontecido na Suécia com a evasão dos pupilos cadastrados de Jan Jönson na noite da estreia, Samuel Beckett comentou: “É o melhor final que a minha peça podia ter tido!”.

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