Eurico de Barros

Eurico de Barros

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Os filmes em cartaz esta semana, de ‘O Maior’ a ‘William Tell – O Guerreiro’

Os filmes em cartaz esta semana, de ‘O Maior’ a ‘William Tell – O Guerreiro’

Tanto cinema, tão pouco tempo. Há filmes em cartaz para todos os gostos e de todos os feitios. Das estreias em cinema aos títulos que, semana após semana, continuam a fazer carreira nas salas. O que encontra abaixo é uma selecção dos filmes que pode ver no escurinho do cinema, que isto não dá para tudo. Há que fazer escolhas e assumi-las (coisa que fazemos, com mais profundidade nas críticas que pode ler mais abaixo nesta lista). Nas semanas em que há estreias importantes de longas-metragens no streaming, também é aqui que as encontra. Bons filmes. Recomendado: Os melhores filmes de 2025 até agora
Parada de terrores: oito filmes a não perder no MOTELX

Parada de terrores: oito filmes a não perder no MOTELX

A 19.ª edição do MOTELX – Festival Internacional de Cinema de Terror de Lisboa decorre entre os dias 9 e 15 de Setembro, no Cinema São Jorge e na Cinemateca Portuguesa, e este ano, segundo a organização, tendo “a condição feminina e a representação da mulher no cinema” como “tema central da programação deste ano”. Foi assim criado um novo galardão, o Prémio Noémia Delgado, “dedicado a mulheres que se tenham distinguido no género do terror”, e baptizado com o nome da poeta e realizadora que viveu entre 1933 e 2016, assinou o documentário Máscaras (1976) e entre 1981 e 1983 rodou para a RTP a minissérie Contos Fantásticos Portugueses, em que adaptou sete obras curtas de outros tantos escritores nacionais, incluindo Eça, Júlio Dinis e Mário de Sá-Carneiro.  A primeira galardoada com este novo prémio é a produtora Gale Ann Hurd (O Exterminador Implacável, Aliens: O Recontro Final, O Abismo, Palpitações, O Incrível Hulk, a série The Walking Dead, entre muitos outros), que estará presente no festival como convidada de honra, apresentará alguns dos filmes que tutelou e dará uma masterclass. Ainda nesta linha, a secção paralela Quarto Perdido deste ano é dedicada ao poder feminino, simbolizado pela figura da bruxa, levando o subtítulo ‘O Baile das Bruxas’ e exibindo apenas filmes portugueses em que esta personagem marca presença, caso de O Crime da Aldeia Velha, de Manuel Guimarães, Alma Viva, de Cristèle Alves Meira, ou A Noite de Walpurgis, de Noémia Delgado, este incluído na refer
As estreias de cinema para ver em Setembro, de ‘Downton Abbey’ a ‘Batalha Atrás de Batalha’

As estreias de cinema para ver em Setembro, de ‘Downton Abbey’ a ‘Batalha Atrás de Batalha’

Setembro traz às salas portuguesas um alinhamento de estreias onde cabem regressos esperados, adaptações literárias e retratos biográficos. Entre os destaques está o capítulo final de Downton Abbey. Já em Hollywood, Paul Thomas Anderson assina o seu filme mais caro até à data, Batalha Atrás de Batalha, com Leonardo DiCaprio à frente de um elenco de luxo e uma história inspirada num livro de Thomas Pynchon. Pelo meio, há espaço para thrillers psicológicos, documentários urgentes, histórias reais e até Nicolas Cage a declarar guerra a uma praia australiana. Estas são as estreias de cinema para ver em Setembro. Recomendado: As estreias de cinema a não perder nos próximos meses
Os melhores filmes de 2025 até agora

Os melhores filmes de 2025 até agora

Com o calor do Verão a intensificar-se, aproveitámos o tempo à sombra para fazer os primeiros balanços do ano. E como não resistimos a uma boa lista fomos vasculhar entre as estreias de cinema a que Portugal já assistiu em 2025 e escolhemos os filmes que mais se destacaram até ao momento. Entre longas-metragens vindas do Irão, da China, da Roménia ou de França, de realizadores consagrados e de estreantes, nos géneros mais variados, do terror ao romance, da animação ao suspense, estes são os melhores filmes de 2025 até agora (dois dos quais que já estão no streaming). Recomendado: Os melhores filmes de 2024
As estreias de cinema para ver em Agosto, de ‘Drácula: Uma História de Amor’ a ‘Eddington’

As estreias de cinema para ver em Agosto, de ‘Drácula: Uma História de Amor’ a ‘Eddington’

Se é daquelas pessoas que prefere a noite e o escuro, em vez do calor, sol e praia, temos boas notícias. Agosto é perfeito para passar dentro da sala de cinema – e não é só por ser mais fresquinho. A contrariar as tendências, o cartaz deste mês está repleto de grandes filmes de terror, como os chocantes Hora do Desaparecimento, de Zach Cregger, ou Eddington, de Ari Aster, que neste novo trabalho decidiu olhar para as teorias da conspiração e para a pandemia, apoiado por actores como Joaquin Phoenix, Pedro Pascal ou Emma Stone. Se não quer sair do cinema com um arrepio na espinha, tem sempre a oportunidade de ver Noiva em Apuros ou Um Dia Ainda Mais Doido, protagonizado por Jamie Lee Curtis e Lindsay Lohan.  Recomendado: As estreias de cinema a não perder nos próximos meses
As estreias de cinema para ver em Julho, de ‘Mundo Jurássico: Renascimento’ a ‘Superman’

As estreias de cinema para ver em Julho, de ‘Mundo Jurássico: Renascimento’ a ‘Superman’

Com o aproximar do Verão abre-se a janela dos blockbusters. Prova disso são os dois grandes destaques deste mês, duas produções que fazem regressar ao ecrã caras conhecidas (e focinhos famosos). Primeiro, o poderoso extra-terrestre Kar-El, por cá conhecido como Super-Homem e desta vez interpretado por David Corenswet. Neste Superman, o homem da câmara é James Gunn. De regresso estão também os dinossauros de Mundo Jurássico, no sétimo filme da franquia iniciada em 1993. Mas nesta lista também há espaço para produções independentes, muitas delas europeias (o britânico Mike Leigh, por exemplo), e vários géneros, do terror à comédia. Descubra os dez filmes a não perder neste mês de Julho. Recomendado: Os 100 melhores filmes de sempre
As estreias de cinema para ver em Junho, de ‘28 Anos Depois’ a ‘F1’

As estreias de cinema para ver em Junho, de ‘28 Anos Depois’ a ‘F1’

Há dois mundos cinematográficos que este mês regressam ao cinema (e um é mesmo o fim do mundo). Por um lado, a saga John Wick apresenta mais um título, este um pouco diferente dos quatro filmes interpretados por Keanu Reeves: Ballerina. Entalada entre os capítulos 3 e 4 da saga, a nova história tem uma nova heroína, Eve Macarro, e uma nova assassina de serviço, interpretada por Ana de Armas. E por outro, 28 Anos Depois, a terceira parte dos filmes pós-apocalípticos 28 Dias Depois (2002) e 28 Semanas Depois (2007). E em Junho temos também Brad Pitt a alta velocidade, com F1. Estas são as dez estreias de cinema que queremos ver em Junho. Recomendado: The Bear, Squid Game e mais sete séries para ver em Junho
Exterminador Implacável: não se pode mesmo exterminá-lo?

Exterminador Implacável: não se pode mesmo exterminá-lo?

Em 1984, Arnold Schwarzenegger teve o seu melhor papel de sempre e encontrou o personagem que o acompanha desde então. Como T-800 (Modelo 101), o actor chocou de frente, por assim dizer, com a sua persona cinematográfica, cortesia do realizador James Cameron, que iniciou aqui uma carreira multimilionária sem nunca mais atingir a qualidade do primeiro par de filmes. Desde então, a saga mereceu seis longas-metragens, com problemas de continuidade entre elas, e duas séries: Terminator: As Crónicas de Sarah Connor (2008) e a série de animação Extreminador Implacável Zero (2024), disponível na Netflix. Mas estes são os filmes, por ordem cronológica. Recomendado: Saiba tudo sobre as novidades do universo ‘A Guerra dos Tronos’
Os melhores filmes de Diane Keaton

Os melhores filmes de Diane Keaton

Woody Allen trouxe-a do palco para o cinema em 1972, na comédia O Grande Conquistador, e fez dela a sua primeira musa, dirigindo-a numa série de filmes onde se destaca, obviamente, Annie Hall, que deu a Diane Keaton o Óscar de Melhor Actriz em 1978. Mas se Keaton é uma consumada actriz cómica, não se limita nem se contenta com esse registo, tendo-se mostrado também uma soberba actriz dramática, como se pode ver, por exemplo, na trilogia O Padrinho, de Francis Ford Coppola, ou num dos filmes mais singulares da sua carreira, À Procura de um Homem. Relembramos os melhores filmes de Diane Keaton. Recomendado: 18 estreias de cinema para ver nos próximos meses
Os melhores filmes de Johnny Depp

Os melhores filmes de Johnny Depp

Johnny Depp foi dirigido neste punhado de filmes, feitos a partir dos anos 1990, quando se impôs em Hollywood, por cineastas como John Waters, Mike Newell e especialmente Tim Burton, com quem já colaborou em oito filmes (nove se contarmos com Alice do Outro Lado do Espelho, do qual Burton é produtor). Depp também tem olho para a realização, tendo em 1997 visto estrear a sua primeira longa-metragem, O Bravo, que também interpreta, com Marlon Brando no elenco. Mas isso é matéria para outra conversa. Estes são os melhores filmes de Johnny Depp, o actor.  Recomendado: Os melhores filmes de Tim Burton
Dez filmes eróticos e de SM a sério

Dez filmes eróticos e de SM a sério

Já se fez muito bom cinema erótico. O Porteiro da Noite, de Liliana Cavani, História de O, de Just Jaeckin, ou A Pianista, de Michael Haneke, foram rodados entre os anos 70 e o início do século XXI, e são alguns dos filmes eróticos e de temática sadomasoquista que entraram para a história do cinema pela sua ousadia e qualidade. Mas não são os únicos. Com argumentos originais ou baseados em livros, com uma pitada de realidade ou fruto do génio criativo, mais e menos polémicos, eis dez filmes eróticos e de sadomasoquismo indispensáveis. Recomendado: Netflix and chill? Os melhores filmes românticos para ver agora
Os melhores filmes de Liam Neeson

Os melhores filmes de Liam Neeson

Liam Neeson é um actor que trabalha. Este ano, tem filmes em várias fases de elaboração, dois deles com estreia marcada para 2025: a comédia de ficção científica Cold Storage e The Naked Gun: Aonde é Que Para a Polícia?!, uma nova versão dos filmes protagonizados por Leslie Nielsen nas décadas de 1980 e 1990. E foi no início dos anos 1980 que Neeson se estreou no cinema, depois de se ter distinguido no palco e ter experimentado a televisão, e nunca mais parou desde então. Faz uma média de quatro filmes por ano, tudo para mais, nada para menos. Recordamos aqui um punhado dos seus melhores papéis, de Vingança Sem Rosto a Silêncio. São estes os melhores filmes de Liam Neeson. Recomendado: O melhor do cinema alternativo em Lisboa

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Downton Abbey: Grand Finale

Downton Abbey: Grand Finale

4 out of 5 stars
Escrito, como sempre, por Julian Fellowes, este terceiro filme deverá ser o derradeiro dos que foram feitos após o colossal sucesso internacional da série homónima criada por aquele. É também o primeiro sem Maggie Smith, cuja personagem morreu no anterior, Downton Abbey: A Nova Era (2022), realizado, como este, por Simon Curtis. Estamos em 1930, logo após o enorme e trágico crash financeiro que abalou os EUA e as bolsas mundiais. Lady Mary vê-se envolvida num escândalo público devido ao seu muito mediatizado divórcio, e a família enfrenta problemas de liquidez, por causa dos investimentos desastrados do bem-intencionado mas incompetente tio americano, Harold (interpretado por Paul Giamatti). Assim, os Crawley são forçados a abraçar a mudança, com a geração seguinte a liderar Downton Abbey para o futuro e garantir a continuidade do seu bom nome, da propriedade e da tradição. E há também uma importante passagem de testemunho ao nível do pessoal da centenária casa senhorial. Fellowes, Curtis e todo o elenco e equipa técnica sabem muito bem o que fazem, da recriação da época à elaboração do enredo e à interacção das personagens, e Downton Abbey: Grand Finale, dedicado a Maggie Smith, é um final lógico e uma despedida ao melhor nível para a saga da família Crawley e dos seus fiéis e dedicados empregados, também eles uma “família” em si. E tem a participação especial de uma das maiores celebridades da época, Noel Coward, que, usando o seu carisma, talento e afabilidade, vai ajudar
Drácula: Uma História de Amor

Drácula: Uma História de Amor

3 out of 5 stars
O realizador francês Luc Besson dá aqui a sua interpretação da história clássica de Bram Stoker, com Caleb Landry Jones como Drácula e Zoë Bleu num duplo papel, o de Maria, por quem o aristocrático vampiro se apaixona loucamente, e o da sua mulher, Elisabeta, morta no século XV durante a invasão dos otomanos. A história passa-se agora na Paris de finais do século XIX, e Besson explora a eterna busca por amor e a esperança de reencontrar a alma gémea através dos tempos, mais do que a componente de terror sobrenatural do livro de Stoker. Drácula é agora um anti-herói trágico e romântico, castigado por desafiar Deus, blasfemar e ter morto um bispo, há boas ideias (o ataque final do exército romeno ao castelo do vampiro) a coexistir com outras menos felizes (a busca pelo perfume irresistível), uma curiosa ambiência de banda desenhada ao longo de todo o filme (lembremos que o realizador já adaptou ao cinema as aventuras de Valerian e de Adèle Blanc-Sec), Christoph Waltz personifica um imperturbável padre caçador de vampiros que é a versão eclesiástica de Van Helsing, e o final é uma original surpresa. + ‘Drácula: Uma História de Amor’: o vampiro apaixonado
Together – Juntos

Together – Juntos

3 out of 5 stars
Longa-metragem de estreia do australiano Michael Shanks filmada nos EUA, Together – Juntos tem Dave Franco e Alison Brie, casados na vida real, interpretando um casal em crise que se muda da cidade para uma casa no campo, numa tentativa de pôr a sua relação nos eixos. Depois de passarem uma noite de tempestade abrigados num buraco em que caíram na floresta, e onde há vestígios da igreja de um insólito culto New Age que ali esteve instalado alguns anos antes, tudo muda entre eles, mas não como estavam à espera. Filme de terror físico schlocky e com algum humor, ora sensual, ora negro e incómodo, Together – Juntos dá uma nova e muito perturbante dimensão à expressão “a minha cara metade”, e um novo significado à canção “2 Become One”, das Spice Girls. E é também um novo e muito forte argumento a favor de se ficar solteiro.
Apanhado a Roubar

Apanhado a Roubar

4 out of 5 stars
Passado na Nova Iorque de final dos anos 90 e partilhando do espírito dos filmes de acção de Quentin Tarantino, dos policiais de Elmore Leonard e de títulos intrinsecamente nova-iorquinos como Nova Iorque Fora de Horas, de Martin Scorsese, ou Good Time, dos irmãos Safdie, Apanhado a Roubar tem Austin Butler no papel de um jovem que podia ter sido uma estrela do basebol mas foi impedido por um trágico acidente de automóvel, trabalha agora como barman, faz o favor a um vizinho de tomar conta do gato dele durante uns dias, e acaba a fugir pela cidade fora com o bicho ao colo, enquanto é perseguido por mafiosos russos brutos como portas, latinos de gatilho fácil, dois irmãos judeus ortodoxos que matam tudo o que mexe e uma polícia corrupta. Darren Aronovsky assina aqui o seu melhor filme desde Cisne Negro, um thriller ultraviolento, ágil, intenso e cheio de humor ácido e personagens perigosamente extravagantes, um entretenimento escapista da melhor confecção. Nova Iorque é uma protagonista activa e não um mero cenário para o enredo, não é preciso conhecer as regras do basebol para seguir a história e o gato Bud quase que “rouba” a fita aos humanos.
O Segundo Acto

O Segundo Acto

3 out of 5 stars
Mais um filme onde Quentin Dupieux, o mais “jarryesco” dos realizadores franceses, cultiva o seu apurado sentido do nonsense e da bagunça formal criativa, pondo em cena, no restaurante no meio do nada com o mesmo nome do título, um quarteto de personagens que não se portam como seria de esperar delas num filme. Florence (Léa Seydoux) está perdidinha de amores por David (Louis Garrel), que não a quer ver nem pintada, e quer atirar para os braços do seu amigo Christian (Raphaël Quenard). Inesperadamente, entra na equação Guillaume (Vincent Lindon), o pai de Florence, a quem ela quer apresentar o seu apaixonado. Dupieux dinamita esta historieta pondo os intérpretes a fugirem constantemente do guião e a falarem das suas vidas pessoais, amorosas e profissionais (há ainda um “secundário” tão nervoso que nem sequer consegue servir o vinho à mesa, e membros da equipa técnica que aparecem aqui e ali), e tornando O Segundo Acto numa charge gostosamente sarcástica ao meio do cinema, às vaidades, rivalidades e ridículos dos actores, ao wokismo e ao #MeToo, e ainda à Inteligência Artificial aplicada à produção de filmes, que nos deixa levemente arrepiados. E, mais uma vez, nos 76 minutos que os seus filmes costumam durar. Se não existisse, Quentin Dupieux tinha que ser inventado.
Verdades Difíceis

Verdades Difíceis

4 out of 5 stars
Marianne Jean-Baptiste é a principal intérprete da nova realização do britânico Mike Leigh, no papel de Pansy, uma dona de casa londrina que está muito longe de ser feliz, é atormentada por toda uma série de fobias e de pequenas paranóias, embirra violenta e amargamente com tudo e todos, e tem conflitos constantes com o muito paciente marido, que trabalha como canalizador, e com o filho, que passa o dia a preguiçar e se sente esmagado e tolhido por ela. Já a sua irmã Chantelle (Michele Austin), mãe solteira, é completamente diferente de Pansy em tudo. Leva uma vida estável e organizada, é dona de um próspero cabeleireiro e as filhas têm bons empregos. Leigh não dirigia Marianne Jean-Baptiste desde Segredos e Mentiras (1996), e tira aqui dela uma interpretação notável de intensidade agressiva e de azedume em jacto contínuo, fazendo dela o oposto polar da sempre alegre e militantemente optimista Poppy de Sally Hawkins em Um Dia de Cada Vez (2008). Onde aquela é solar e o filme exuberante, Pansy é sombria e Verdades Difíceis crispado. Mike Leigh não nos decifra esta intragável personagem – decerto a mais problemática e antipática das várias deste tipo que já filmou, ficcionais ou reais –, embora no final deixe no ar algumas vagas pistas que poderão ajudar; nem nos pede compaixão para ela (temos pena é dos familiares, dos conhecidos e dos estranhos que ela atormenta e destrata ao longo da fita…) ou trata como um estereótipo de melodrama ou tragicómico, abstendo-se ainda de qualqu
Comboio do Ártico

Comboio do Ártico

3 out of 5 stars
Grande produção norueguesa passada durante a II Guerra Mundial, Comboio do Ártico é realizada por Henrik Martin Dahlsbakken. O filme acompanha, no Verão de 1942, os 35 navios civis que formam um comboio que transporta, pela perigosa rota do Árctico, material bélico e abastecimentos vitais para a União Soviética invadida pelos alemães. De súbito, há ordens para o comboio ser desfeito e os cargueiros optarem para continuarem a seguir para Murmansk, o seu destino, ou regressarem à Islândia, de onde partiram. Dahlsbakken passa então a centrar a acção num barco que fica isolado e à mercê das minas e dos ataques dos submarinos e aviões inimigos. Comboio do Ártico transforma-se então num filme de suspense eficaz e muito realista, e passa a focar-se nos conflitos, nas tensões e nas relações entre os membros da tripulação, que não deixam de fora o comandante. Este quer prosseguir na rota definida mas o imediato é da opinião que se deve ou regressar, ou ir para águas geladas mais seguras. A fita foi rodada num velho barco de transporte de carvão que participou nas duas guerras mundiais e foi preservado, o que contribui muito para a autenticidade da atmosfera vivida a bordo.
O Ritual

O Ritual

3 out of 5 stars
Os filmes de terror sobre exorcismos são todos devedores, inevitavelmente, de O Exorcista, de William Friedkin. E nenhum dos muitos já feitos depois conseguiram alçar-se ao nível deste, mesmo quando tentaram contornar ou inovar a pauta narrativa, estilística e emocional que a fita de Friedkin estabeleceu (ver, por exemplo, o recente O Exorcismo, de Joshua John Miller, com Russell Crowe). Em O Ritual, passado no interior dos EUA nos anos 20 e alegadamente baseado em factos reais, como é habitual nestes filmes, David Midell recorre às situações, convenções e personagens tipificadas que este subgénero do terror sobrenatural consagrou, mas consegue ao mesmo tempo escapar-se ao espartilho do formato, ao dar tanta atenção ao exorcismo em si como à erosão física, à inquietação psicológica e à perturbação espiritual sentida pelos dois padres que o estão a fazer, e pelas freiras do mosteiro em que se encontram. Midell tem ainda uma abordagem visual e gráfica mais elíptica e comedida do que o habitual às sequências de possessão e de exorcismo, que rima com a interpretação invulgarmente contida de Al Pacino no frade capuchinho exorcista, bem coadjuvado por Dan Stevens no jovem padre perturbado pelo recente suicídio do irmão, e que sente a sua fé abalada. Aliás, uma das sequências mais conseguidas e arrepiantes de O Ritual não é de exorcismo, mas sim aquela em que a personagem de Pacino é visitada, de noite, por uma entidade demoníaca, que fica na sombra a proferir as suas ameaças.
A Vida de Chuck

A Vida de Chuck

3 out of 5 stars
Tom Hiddleston interpreta o papel do título nesta adaptação de uma novela de Stephen King, uma história contada em sentido cronológico inverso e três partes, que começa com o fim da vida de Chuck Krantz, um homem comum que nunca saiu da pequena cidade dos EUA em que viu a luz do dia e cresceu, mas à qual está ligada o destino do universo, e depois recua no tempo para ver como ele a viveu. Realizado por Mike Flanagan, que já assinou outras duas adaptações de livros do escritor, Jogo Perigoso (2017) e Doutor Sono (2019), A Vida de Chuck assenta um pé no fantástico e outro no realismo (que Stephen King também cultiva ocasionalmente), a sua decifração assenta num poema de Walt Whitman que é referido por um par de vezes durante a história, e assemelha-se ao resultado da junção do espírito de um filme de Frank Capra como Do Céu Caiu Uma Estrela com o da série The Twilight Zone. Tem alguma sacarina, mas que não chega para ser enjoativo, e a “mensagem” é evidente, embora não pese demais, e a primeira parte, quando se começam a manifestar os sinais do fim do universo associados à agonia de Krantz, quase que vale por toda a fita, que tanto pode ser entendida metaforica (a morte de um homem é também a de todo um universo que ele contém) como literalmente (a existência do universo está, de forma inexplicável, ligada à de um indivíduo anónimo e aparentemente sem importância). Mark Hamill interpreta o papel do avô de Chuck.
Missão: Impossível – O Ajuste de Contas Final

Missão: Impossível – O Ajuste de Contas Final

3 out of 5 stars
Chega finalmente aos ecrãs a segunda parte, e oitavo título, daquele que será o derradeiro filme desta série de espionagem e acção protagonizada por Tom Cruise desde o primeiro, estreado em 1996, há quase 30 anos. Ethan Hunt e a sua equipa, mais alguns aliados que apanham pelo caminho, continuam a tentar anular a Entidade incorpórea (o vilão digital da fita) que se quer apoderar de todos os arsenais nucleares mundiais e desencadear um holocausto atómico no planeta, bem como Gabriel (o segundo vilão, este humano), que pretende, pelo seu lado, controlar a Entidade e ser ele a mandar no planeta. Embora com menos e menos variadas sequências de acção do que o anterior, Missão: Impossível – Ajuste de Contas – Parte Um (2023), e um pouco mais de palha de explicações e de exposição, sobretudo na primeira meia hora, Missão: Impossível – O Ajuste de Contas Final, realizado com mão firme e visão panorâmica por Christopher McQuarrie (no seu quarto filme da série), continua à altura dos pergaminhos desta saga que passou a ocupar o lugar central no cinema do género (sobretudo depois que James Bond deixou de se manifestar), e Tom Cruise, à beira de fazer 63 anos, afirma-se mais uma vez, e em simultâneo, como superprodutor, “estrela” de primeira grandeza e como o actor mais trabalhador, entusiasmado, profissional e que mais arrisca – a própria vida, mesmo, já que dispensa os “duplos” – para dar o maior, melhor, mais arrebatador e inédito espectáculo do mundo aos espectadores. A longa sequênc
Juventude: Primavera/ Tempos Difíceis/ Regresso a Casa

Juventude: Primavera/ Tempos Difíceis/ Regresso a Casa

4 out of 5 stars
Colossal documentário em três partes, totalizando cerca de 10 horas de duração, assinado pelo realizador chinês Wang Bing. Co-produzido com três países europeus, Juventude foi rodado entre 2014 e 2019 na cidade de Zhili onde se concentram muitos milhares de pequenas fábricas de vestuário, sobretudo infantil, e trabalham e vivem, em condições precárias, cerca de 300 mil pessoas, quase todas jovens e vindas do campo. Bing dá-nos um amplo e detalhado panorama do repetitivo dia-a-dia destes trabalhadores sazonais, adolescentes ou na casa dos 20 anos, do seu convívio, entre brincadeiras e namoros, dos choques com os empresários que os contrataram (sobretudo na segunda parte, Tempos Difíceis), e das suas aspirações e frustrações, filmando-os ainda em viagem e junto das suas famílias. Retrato de uma nova geração de chineses ao trabalho nas suas máquinas de costura e em movimento entre o campo e a urbe, Juventude mostra também as realidades e o funcionamento do modelo económico-industrial que permite à China inundar o mundo com os seus produtos baratos e em que a quantidade prima sobre a qualidade, e o grande fosso que existe ainda entre o país urbano que o Estado chinês exibe como vitrina do progresso e da superioridade tecnológica, económica e industrial chinesa, e o país rural, onde muitas coisas continuam como a ser como eram há muito tempo, e que é visto na terceira parte, Regresso a Casa. Através dos seus longos documentários (este Juventude não escapa a alguma repetição e pode
O Esquema Fenício

O Esquema Fenício

3 out of 5 stars
Pouco antes da actual moda dos “Starter Packs” na Internet, houve outra, que embora breve, foi bastante significativa para os cinéfilos: a dos falsos trailers de filmes de sucesso mundial, tal como teriam sido realizados por Wes Anderson, gerados por Inteligência Artificial (IA) e feitos por fãs do realizador de Um Peixe Fora de Água, Moonrise Kingdom e O Grande Hotel Budapeste. Entre os melhores destes trailers brincalhões, todos eles pastiches impecáveis do inconfundível estilo visual de Anderson e que podem ser encontrados no YouTube, estão os de franchises como Guerra das Estrelas, The Matrix, O Senhor dos Anéis e Harry Potter. Já antes o célebre programa Saturday Night Live tinha feito um sketch com a forma de um trailer de um falso filme de terror de Anderson, intitulado The Midnight Coterie of Sinister Intruders, onde Edward Norton finge ser Owen Wilson, um dos actores favoritos e regulares do realizador. Estas novas brincadeiras digitais em redor da peculiar estética de Wes Anderson levaram ao aparecimento de alguns artigos sisudos sobre os perigos da IA na sua aplicação ao cinema. Mas não se pode negar aos autores dos ditos trailers conhecimento dos tiques cinematográficos do cineasta, muito menos sentido de humor. E Anderson não reagiu mal aos ditos, sentindo-se até lisonjeado. Eles são, aliás, uma manifestação da enorme popularidade do realizador e do culto que o rodeia. Os seus idiossincráticos filmes podem irritar muita gente e ser aclamados por outra tanta, mas

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‘Com a Alma na Mão, Caminha’: debaixo de fogo mas com esperança em Gaza

‘Com a Alma na Mão, Caminha’: debaixo de fogo mas com esperança em Gaza

Fatma Hassouna era uma fotojornalista palestiniana de 25 anos que, depois da invasão israelita, ficou em Gaza a documentar, com as suas imagens, os bombardeamentos, a gradual destruição da cidade, a dor da população e também a sua capacidade de resistência e de manter um semblante de vida quotidiana no meio da devastação, da falta de comida e água e do luto pelos familiares e amigos mortos. A realizadora iraniana Sepideh Farsi, refugiada no Ocidente desde os anos 80, conheceu-a através de um amigo comum, e fez dela a protagonista do seu documentário Com a Alma na Mão, Caminha, uma frase que Hassouna lhe disse durante uma das suas muitas conversas telefónicas. Fatma e Sepideh nunca estiveram juntas. O filme é composto a 90 por cento das suas conversas, pontuadas aqui e ali com imagens dos canais televisivos de notícias sobre a situação em Gaza, e também por fotografias tiradas por Fatma, que foi filmada pela realizadora no seu telemóvel durante as videochamadas que fizeram, ao longo de mais de 200 dias, e nas quais aquela lê também alguns dos poemas que escreveu, e canta. Ocasionalmente, aparecem alguns membros da sua família, caso dos irmãos, ou vizinhos. Fatma corre perigo todos os dias e conta o que é estar debaixo de fogo constantemente, viver em condições precárias, com o abastecimento de água e luz racionado, e a Internet a ir e vir, estar praticamente sem comida durante vários dias e perder familiares, amigos e vizinhos nos bombardeamentos. Que por vezes acontecem duran
O Pátio das Antigas: Precisa de óculos? Vá ao Rodrigues Oculista

O Pátio das Antigas: Precisa de óculos? Vá ao Rodrigues Oculista

No tempo em que era o centro comercial, social, cultural e de entretenimento de Lisboa, pelo menos até à década de 80 do século passado, antes do grande incêndio do Chiado, a Baixa estava cheia de letreiros e reclames luminosos. Um dos que certamente não foram esquecidos por quem era criança nessa altura e ia com familiares à Baixa, às compras ou passear e ver as montras à noite, era o da casa Rodrigues Oculista: a enorme cabeça de uma mulher, com uns óculos de armação negros e olhos fixos, que a faziam parecer saída de um filme de terror ou de ficção científica. Aberta em finais do século XVIII na Rua da Prata, a Rodrigues Oculista passou a ser gerida, desde 1886, por um dos seus empregados, Eduardo Artur Rodrigues, que a recebeu de um dos antigos proprietários, tornando-se a partir daí num negócio de família, com oficina de fabrico e de reparações própria, e num estabelecimento de referência do seu ramo na Baixa. Nas publicidades publicadas então na imprensa, destacava ser uma “óptica moderna” e praticar “preços sem concorrência”, e teve um anúncio na rádio na década de 60, cujo slogan, simples e eficaz, ficava logo no ouvido: “Precisa de óculos? Vá ao Rodrigues Oculista”. Já neste século, a casa que tinha ultrapassado os 200 anos de existência foi reconvertida num moderno centro óptico. Mas sem o anúncio luminoso da cabeça da senhora com óculos. Coisas e loisas de outras eras + Noite & Dia, o “self-service” e “snack bar” que mexeu com Lisboa há 60 anos + Roupa branca “eleg
O Pátio das Antigas: Noite & Dia, o “self-service” e “snack bar” que mexeu com Lisboa há 60 anos

O Pátio das Antigas: Noite & Dia, o “self-service” e “snack bar” que mexeu com Lisboa há 60 anos

Este artigo foi originalmente publicado na revista Time Out Lisboa, edição 673 — Primavera 2025 “Parece que estamos na América!”, dizia, de tabuleiro na mão, à reportagem da televisão, um cliente do Noite & Dia, o self-service e snack-bar que tinha acabado de abrir na Avenida Duque de Loulé, nesse distante dia de Outubro de 1965, e que era a mais recente sensação de Lisboa em termos de lugares onde se podia ir comer. Projectado pela célebre dupla de arquitectos Victor Palla e Bento de Almeida (também responsáveis, na capital, pelo Galeto, pelo Pique-Nique ou pelo Pam-Pam, dos quais apenas o primeiro existe ainda), o Noite & Dia era o segundo self-service a abrir em Lisboa (o pioneiro foi o Solar de Aviz, um pouco mais abaixo, na Avenida da Liberdade), mas foi o primeiro a juntar a componente “self” e a “snack”, e depressa se tornou mais popular do que este. O self-service funcionava ao nível da rua, enquanto que o snack estava localizado na cave.  O Noite & Dia teve também, naturalmente, os seus detractores, que viam com desagrado esta forma de se comer “à americana”, em que as pessoas tinham que fazer fila para escolher a comida em vez de serem servidas por um empregado, e depois andarem de tabuleiro na mão à procura de mesa para se sentarem. Um sacrilégio, no país dos almoços e jantares longos, bem saboreados, com muita conversa pelo meio, rematados com café, cigarros e um digestivo. Mas o Noite & Dia era um sinal (mais um, de muitos na década de 60) de que os hábitos, o ri
‘Drácula: Uma História de Amor’: o vampiro apaixonado

‘Drácula: Uma História de Amor’: o vampiro apaixonado

O Conde Drácula criado por Bram Stoker no seu livro clássico publicado em 1897, é a personagem da literatura de terror personificada por mais actores no cinema e na televisão do que qualquer outra. Entre os muitos que já o interpretaram contam-se nomes como Bela Lugosi, Christopher Lee, John Carradine, Klaus Kinski, Max Schreck, Leslie Nielsen, David Niven, Rutger Hauer, Louis Jourdan, Francis Lederer, Jack Palance, Frank Langella, Gary Oldman, Thomas Kretschmann, Ray Liotta, Nicolas Cage, Bill Skarsgard, George Hamilton, Denholm Elliott, John Carradine, Udo Kier ou Claes Bang, entre muitos outros. O Drácula de Lugosi foi eleito o 33.º Melhor Vilão do Cinema pelo American Film Institute, e uma votação da revista inglesa Empire elegeu Christopher Lee a sétima Maior Personagem da História do Cinema de Terror. Os filmes de Drácula são numerosíssimos, muitas centenas, e vão desde o terror puro e duro até à comédia, incluindo mesmo a pornografia, em títulos tão curiosos como Sex and the Single Vampire (1970) ou Dracula and the Boys (1969), esta a primeira fita homossexual de vampiros (há ainda bastantes séries de televisão, telefilmes, curtas-metragens e animações). O crítico e autor de livros de terror e ficção científica inglês Kim Newman, grande conhecedor de cinema de terror e especialista na figura de Drácula, tem-se dedicado a recensear, meticulosamente, no seu site (johnnyalucard.com), todos os filmes em que o vampiro mais famoso do mundo aparece, desde produções clássicas
‘The Naked Gun: Aonde é que Pára a Polícia?’: por favor, não chamem a polícia!

‘The Naked Gun: Aonde é que Pára a Polícia?’: por favor, não chamem a polícia!

Nos anos 80 e 90, as iniciais ZAZ eram, em Hollywood, sinónimo de comédia nonsense de grande quilate. Entre 1980 e 1994, altura em que se separaram, David Zucker, Jim Abrahams e Jerry Zucker, irmão daquele, e amigos desde a infância, foram responsáveis (nalguns casos, também com a colaboração de Pat Proft), pela produção, escrita e realização de títulos de enorme sucesso comercial e de crítica como Aeroplano! (1980), paródia brilhante aos filmes-catástrofe de aviação, Ultra Secreto (1984), gozo pegado às fitas passadas na II Guerra Mundial e de espionagem (e de passagem, aos surf movies e aos musicais), e a uma trilogia, Aonde é que Pára a Polícia?. Esta reduzia jubilatoriamente a pó as séries e filmes policiais em todos os seus estereótipos, situações feitas, enredos preguiçosos e personagens tipificadas, e saiu de uma série de televisão também dos ZAZ, Polícias à Parte (1982), que teve apenas seis episódios e passou em Portugal na RTP. Esta série, e os três filmes que se lhe seguiram, Aonde é que Pára a Polícia? (1988), Aonde é que Pára a Polícia? Parte 2 ½: O Aroma do Medo (1991) e Aonde é que Pára a Polícia 33 1/3 (1994), deram ao veterano Leslie Nielsen o papel do tenente Frank Drebin, da Polícia de Los Angeles, o agente da lei mais insondavelmente burro e inacreditavelmente desastrado da história do cinema cómico, émulo americano do Inspetor Clouseau de Peter Sellers. Depois de 15 anos de triunfos, e de terem associado os seus nomes ao melhor do cinema de comédia absurd
O Pátio das Antigas: Roupa branca “elegante e chic” era na Loja da América

O Pátio das Antigas: Roupa branca “elegante e chic” era na Loja da América

Até o Tio Sam foi mobilizado para publicitar a Loja da América, inaugurada na Baixa, na Rua do Ouro, em 1872. Com efeito, num anúncio de jornal de 1900, reproduzido no blogue Restos de Colecção, a figura que personifica os EUA surge a publicitar uma “Exposição de Rouparia para senhoras, homens e crianças (…), com “Modelos das primeiras casas de Paris, Berne e Valência”, feitos expressamente para a LOJA DA AMÉRICA”. Sem faltar os “enxovaes completos para noivas e baptisados”. Hoje quase totalmente esquecida, a Loja da América foi uma das mais célebres e bem afreguesadas da Baixa. Vendia tudo o que fosse “roupa branca”, quer de uso pessoal, quer doméstico, com um acervo que ia das camisas, lenços, camisolas interiores e dos referidos “enxovaes”, aos panos de linho, algodão e americanos, guardanapos, lençóis, colchas e “robes-chambres”, tudo em “modelos exclusivos” e do mais “elegante e chic”. O proprietário da Loja da América tinha também a Camisaria Americana, situada uns números mais abaixo, especializada em camisas, e que a complementava neste tipo de artigos de vestuário masculino. A Camisaria Americana foi a primeira a fechar, no final da I Guerra Mundial. A Loja da América encerrou no início dos anos 50, não resistindo à concorrência das lojas mais recentes e modernas. Coisas e loisas de outras eras + O Monte Carlo, uma lenda do Saldanha + Os carrinhos de pedais do Jardim Zoológico + A sapataria requintada da Rua Garrett + O Salão Central que depois foi Central Cinema
‘Quarteto Fantástico: Primeiros Passos’: os super-heróis querem regressar em grande

‘Quarteto Fantástico: Primeiros Passos’: os super-heróis querem regressar em grande

O título deste filme de Matt Shakman, O Quarteto Fantástico: Primeiros Passos (estreia-se esta semana) induz em erro, sobretudo os menos atentos a estas coisas dos comics de super-heróis e do cinema. Estes não são, de forma alguma, os primeiros passos das quatro super-personagens criadas em 1961 para a Marvel por Stan Lee e Jack Kirby, seja nos filmes, seja na televisão, seja na animação, ou mesmo na rádio (em 1975, houve uma adaptação radiofónica das aventuras do Quarteto Fantástico, e quem deu voz ao Tocha Humana foi... Bill Murray, então um quase desconhecido que se preparava para entrar no Saturday Night Live, e iniciar a sua caminhada para a fama).  Com efeito, o Quarteto Fantástico – Sr. Fantástico, Mulher Invisível, Tocha Humana, A Coisa – já foi protagonista de quatro séries de desenhos animados na televisão, entre 1967 e 2006, e de nada mais, nada menos, do que quatro filmes de longa-metragem em imagem real. O primeiro, The Fantastic Four, data de 1994, foi produzido por Roger Corman e nunca se estreou comercialmente, por questões relacionadas com direitos, e só pode ser visto em versão pirata; o segundo, Quarteto Fantástico, feito em 2005, teve uma continuação em 2007, Quarteto Fantástico e o Surfista Prateado; finalmente, em 2015, surgiu Quarteto Fantástico, um reboot da fita de 1994. As críticas destes três filmes não foram boas, mas os dois primeiros portaram-se bem nas bilheteiras (ao contrário da versão de 2015, que falhou com estrondo). A ideia de mais um film
‘Sei o que Fizeste no Verão Passado’: o assassino do gancho não desiste

‘Sei o que Fizeste no Verão Passado’: o assassino do gancho não desiste

No final dos anos 90 e no início deste século, Kevin Williamson era um dos argumentistas mais prolíferos, populares e solicitados em Hollywood, e mais dedicados ao thriller de terror, ao fantástico e à ficção científica. Williamson escreveu, então, entre outros, filmes como Gritos (1996) e Gritos 2 (1997), de Wes Craven, Mistério na Faculdade (1998), de Robert Rodriguez, Amaldiçoados (2005), também de Wes Craven, criou a série Dawson’s Creek (1998-2003) e assinou o argumento e a realização do muito curioso – embora também muito maltratado pela crítica –, O Rapto da Senhora Tingle (1999), com Helen Mirren no papel principal, o de uma exigente professora de liceu que entra em conflito radical com uma aluna finalista. Um dos maiores sucessos de Kevin Williamson nessa altura foi Sei o que Fizeste no Verão Passado (1997), de Jim Gillespie, um teen slasher um pouco menos convencional e bastante menos sangrento do que o habitual neste subgénero do terror. É a história de quatro adolescentes que uma noite, de volta da praia, atropelam uma pessoa na estrada. Em pânico, e depois de outro amigo do grupo ter passado por eles de carro, os jovens decidem atirar o corpo ao mar, embora o homem ainda dê sinais de vida. O quarteto jura nunca mais falar no que aconteceu e cada um deles segue o seu caminho. Um ano mais tarde, uma das raparigas recebe uma carta anónima em que se lê apenas: “Sei o que fizeste no Verão passado”. E a seguir, uma figura vestida com um chapéu e um oleado de pescador c
‘Ler Lolita em Teerão’: a literatura contra a teocracia iraniana

‘Ler Lolita em Teerão’: a literatura contra a teocracia iraniana

Em 1979, Azar Nafisi, uma jovem iraniana recém-formada em Literatura Inglesa nos EUA, regressou ao seu país com o marido, Bijan, confiando que o novo regime revolucionário islâmico que pouco tempo antes tinha derrubado o governo do Xá Reza Pahlevi iria mudar o país para melhor. E ela e Bijan queriam muito contribuir para isso. Nafisi foi recebida de braços abertos e começou a dar aulas da sua especialidade na Universidade de Teerão. Mas cedo começou a perceber que as coisas iam mudar no Irão, sim, mas para pior, e que sob a tutela do soturno ayatollah Khomeini, o país ia ser transformado numa teocracia da qual as mulheres estariam entre as principais vítimas. Além de ser obrigada a usar véu, Azar Nafisi viu a universidade onde leccionava tornar-se cada vez mais sufocante em termos de liberdade de ensino, de troca de opiniões e de debate, até tudo ficar completamente submetido aos ditames do Corão e da lei islâmica. Farta e revoltada, Nafisi acabou por ser expulsa, passando a ensinar noutra universidade em 1981, da qual se demitiria em 1987. Entre 1995 e 1997, formou um clube de leitura em sua casa, com seis das suas antigas e melhores alunas, cujas vidas tinham entretanto dado muitas voltas, dedicado à leitura e discussão de vários clássicos da literatura, caso de Lolita, de Vladimir Nabokov, O Grande Gatsby, de Scott Fitzgerald, Daisy Miller, de Henry James, e Orgulho e Preconceito, de Jane Austen (estão todos proibidos no Irão), assim como As Mil e Uma Noites. Para elas, a
O Pátio das Antigas: O Monte Carlo, uma lenda do Saldanha

O Pátio das Antigas: O Monte Carlo, uma lenda do Saldanha

Faz agora 70 anos, em 1955, foi inaugurado na Avenida Fontes Pereira de Melo, mesmo a chegar ao Saldanha, o Café-Restaurante Monte Carlo, paredes meias com o seu congénere Monumental, aberto também nesse mesmo ano e incluído no edifício do imponente Cine-Teatro Monumental. Ocupando o espaço onde tinha estado a Pastelaria Fradique, o Monte Carlo formava, com o Monumental e A Paulistana, este situado no lado oposto da avenida, um emblemático trio de cafés da zona do Saldanha. O Monte Carlo era um mundo em si. À entrada, havia um porteiro fardado e uma das melhores tabacarias de Lisboa (antes do 25 de Abril, até se lá comprava a Playboy por baixo do balcão…). Tinha bilhares e barbearia e jogava-se lá xadrez, damas e cavalos. O restaurante servia o famoso Bife à Monte Carlo e foi o primeiro a ter comida indiana na capital, caso de um muito popular Balchão de Gambas. Além dos habitués, alguns dos quais passavam lá o dia, chegavam de manhã e só saíam quando as portas fechavam, bem depois da meia-noite, o Monte Carlo era frequentado por tudo que era artista, intelectual, jornalista, toureiro, desportista e político, do regime e da oposição. Toda a gente lá cabia, até alguns excêntricos conhecidos. A demolição do Monumental, em 1984, e a consequente desolação do Saldanha, ditaram a decadência do Monte Carlo, que fechou no final dessa década. Hoje está lá uma loja de roupas. Coisas e loisas de outras eras + Os carrinhos de pedais do Jardim Zoológico + A sapataria requintada da Rua Gar
Diga 33… anos de curtas em Vila do Conde

Diga 33… anos de curtas em Vila do Conde

Nome destacado e singular do cinema independente norte-americano na década de 90, e ligado a Nova Iorque, Whit Stillman, autor de fitas como Metropolitan (1990), Barcelona (1994) ou The Last Days of Disco (1998), vai ser um dos convidados da edição deste ano do Curtas Vila do Conde (12 a 20 de Julho), na secção In Focus. Stillman trará cinco dos seus filmes e participará, a 18 de Julho, numa conversa moderada por Daniel Ribas, que concluirá com um filme-surpresa; e no dia 17, na sessão Making Low Budget Films, o cineasta irá conversar com jovens realizadores presentes no festival que procuram produzir longas-metragens de baixo orçamento, dando como exemplo não só casos anteriores de sucesso rodados por  nomes como Lena Dunham, Spike Lee ou Lloyd Kaufman, como também filmes seus feitos com orçamentos curtos, caso de Metropolitan e Damsels in Distress. A secção In Focus da 33.ª edição do Curtas Vila do Conde irá ainda acolher o realizador palestiniano Mahdi Fleifel, do qual o Festival de Cannes exibiu To a Land Unknown (2024). Este será, em estreia portuguesa, um dos filmes de Fleifel a ver em Vila do Conde, mais nove curtas-metragens suas. Haverá, a 19 de Julho, uma conversa com Mahdi Fleifel, moderada por Ricardo Alexandre, em que serão exibidas as curtas 20 Handshakes for Peace (2014) e I Signed the Petition (2018). Já a secção New Voices será dedicada a Maureen Fazendeiro, francesa radicada em Portugal. O Curtas estreará a sua nova curta-metragem, Les Habitants, e passará,
‘28 Anos Depois’: regresso ao mundo pós-apocalipse

‘28 Anos Depois’: regresso ao mundo pós-apocalipse

Algum tempo após a estreia do seu filme de ficção científica pós-apocalíptica 28 Dias Depois, em 2002, o realizador Danny Boyle declarou que este “não era um filme de zombies”. Mas a verdade é que a fita, escrita por Alex Garland e passada após a disseminação acidental de um vírus da raiva altamente contagioso que leva ao colapso da sociedade em toda a Grã Bretanha, foi fundamental para dar um novo fôlego aos zombies no cinema – e também na televisão (e gerou ainda as inevitáveis imitações grosseiras). Ao facto não foi também alheio o facto de 28 Dias Depois, feito com um orçamento modesto, ter constituído um sucesso de crítica e comercial, e sido um dos filmes mais lucrativos do seu género naquele ano. Perante tudo isto, a ideia de uma continuação foi logo acalentada por Boyle, Garland e pelo produtor Andrew Macdonald, mas passaram cinco anos até que o filme, intitulado 28 Semanas Depois, se estreasse nos cinemas. O realizador, o argumentista e os principais actores (entre eles Cillian Murphy, intérprete do principal papel de 28 Dias Depois) estavam ocupados com outros projectos, e Boyle contactou o seu colega espanhol Juan Carlos Fresnadillo (autor, entre outros, de Intacto) para o rodar e participar na escrita do argumento, sob a supervisão geral de Alex Garland. O que levou a uma remodelação total da história original da fita, atrasando consideravelmente as filmagens. Interpretado por Robert Carlyle, Jeremy Renner, Idris Elba e Rose Byrne, 28 Semanas Depois surgiu em 2007