[title]
Claire (Catherine Frot) é parteira numa maternidade que vai fechar, para dar lugar a uma moderna “fábrica de bebés”, como ela diz ironicamente. Vive com o filho, um universitário que está a sair de casa para ir morar com a namorada, dedica-se totalmente aos outros e abdicou de ter vida sentimental. Um dia, sai-lhe ao caminho, vinda do passado, Béatrice (Catherine Deneuve), a antiga amante do pai, uma sedutora e aventureira, mais velha, mais bonita e mais excêntrica do que ela, e completamente irresponsável.
Béatrice tem o vício do jogo, não tem onde cair morta, anda a empenhar as jóias para se aguentar e tem um tumor no cérebro. E não sabe que o seu ex-amante, e homem da sua vida, se suicidou depois de ela o ter deixado, o que Claire nunca lhe perdoou. Apesar disso, acolhe-a em casa, pondo a compaixão acima do rancor.
Entre elas nasce uma relação entre ressentimentos e arrependimentos, momentos de cumplicidade e de conflito, avanços e recuos afectivos, mas que acaba por abrir vasos comunicantes. Apoiado nas soberbas interpretações das duas Catherines, Frot na altruísta devotada mas íntima e afectivamente deficitária, Deneuve na allumeuse caprichosa mas decadente e com terror da solidão e da morte, ambas mais frágeis do que querem admitir, Martin Provost assina uma comédia dramática justíssima de tom e humaníssima no olhar, que se inscreve na melhor cepa do cinema realista francês. Du solide, como eles dizem.
Por Eurico de Barros