Amarrados

Há sugestões do M. Night Shyamalan de A Aldeia, e de filmes de terror como Um Lugar Silencioso e Às Cegas, em Amarrados, de Alexandre Aja, interpretado e produzido por Halle Berry. Esta interpreta uma mulher que vive numa velha casa de madeira no meio de uma floresta, acompanhada apenas pelos seus dois filhos pequenos, gémeos dissemelhantes, Nolan (Percy Daggs IV) e Samuel (Anthony B. Jenkins). Esta família vive de forma muito precária e sempre em sobressalto, porque segundo conta a mãe aos dois filhos, um grande (e nunca definido ou especificado) Mal de origem sobrenatural tomou conta do mundo e possuiu as pessoas, causando o colapso das sociedades. 

O trio e o pai fugiram da cidade para aquela cabana isolada, construída pelo avô dos garotos, mas aquele foi tocado por uma pessoa contaminada pelo Mal e perdeu-se para eles. A casa tem uma propriedade importantíssima: ninguém possuído pelo misterioso mal pode lá entrar. E mãe e filhos podem deslocar-se até à estufa próxima da casa, onde tentam cultivar alguns vegetais, e ir até à floresta em busca de caça ou de insectos para comerem, desde que o façam amarrados e unidos por umas fortes e longas cordas com que o avô equipou a casa. Nunca, por nunca, podem soltar-se, porque aí poderão ser tocados e contaminados por aqueles que ali rodam – incluindo o pai. Como o Mal não ataca os animais, a mãe, Nolan e Samuel têm a companhia de um cão, o fiel Koba.

Só a mãe consegue ver as pessoas atingidas pelo Mal que andam pela floresta, e que incluem, além do pai das crianças, a avó materna delas, que tem traços semi-monstruosos ao contrário daquele, que aparece com o seu aspecto normal – até à altura em que começa a ameaçar aquela que foi a sua mulher. O Inverno foi muito duro, a caça está difícil de apanhar e mãe e filho têm dias em que estão reduzidos a comer insectos e cascas de árvore. Enquanto Nolan obedece à mãe sem nunca a questionar, Samuel, atormentado pela fome, e depois de um acto impensado que quase custa a vida ao irmão quando andavam ambos na floresta, começa pouco a pouco a duvidar dela e a pensar se não inventou tudo aquilo para os manter sempre obedientes, junto dela e muito limitados nos seus movimentos. E tudo se precipita quando um dia a mãe diz aos filhos que não há nada para comer e que é preciso matar Koba, se não querem morrer de fome.

Amarrados não é um filme que recorra a sustos e baques para construir os ambientes de terror. Aja prefere jogar com a tensão permanente da situação que escora a história, e depois com a inquietação da dúvida sobre se o que a mãe diz é inventado ou verdadeiro. A floresta omnipresente, os seus sons, sombras e recantos desempenham um papel muito importante na criação da densa atmosfera de temor, incerteza e suspense, bem como a velha e sombria casa cujos ocupantes dependem de velas para ter iluminação. Berry é muito boa na devotadíssima mãe que poderá ser ou louca, ou saber o que os filhos não sabem e por isso chegar por vezes a extremos no seu zelo protector, e até aterrorizar os filhos. E os dois rapazinhos estão à altura do que os seus papéis exigem a cada um.

O final de Amarrados não tem, no entanto, uma reviravolta ao estilo de Shyamalan em que tudo é revelado e elucidado. Ao invés de se assumir completamente como uma pura narrativa de terror, o filme poderá ser, em alternativa, uma enorme metáfora para o espírito maternal possessivo e as consequências dos seus excessos. As coisas ficam confusas perto da conclusão, por causa de um argumento que não se sabe explicar bem na altura em que o devia fazer, e tudo por causa do que acontece a Nolan, e o faz agir como age com o irmão. Mesmo assim, e apesar de uns 15 minutos finais que não estão à altura de tudo o que foi feito antes, Amarrados tem argumentos suficientes para merecer a atenção dos apreciadores de fitas de terror.