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Com Amor e com Raiva

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Avec Amour et Acharnement
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A Time Out diz

Juliette Binoche e Vincent Lindon são dois dos vértices do triângulo amoroso deste filme de Claire Denis, mas a geometria dramática não entusiasma.

Os primeiros 20 minutos de Com Amor e com Raiva, de Claire Denis, são só amor. Sara (Juliette Binoche), uma jornalista que tem um programa de rádio, e Jean (Vincent Lindon), um antigo jogador de râguebi que cometeu um deslize, esteve preso algum tempo e agora está a tentar refazer a vida, estão juntos há alguns anos e parecem ser a imagem da felicidade e da harmonia, primeiro em férias na praia, depois no apartamento parisiense de Sara. A conta-gotas, a realizadora (que depois de O Meu Belo Sol Interior, de 2017, volta aqui a adaptar um romance da escritora Christine Angot) vai fornecendo mais alguma informação sobre ambos.

Sara esteve junta com François (Grégoire Colin), que deixou para ir viver com Jean, o qual, pelo seu lado, tem um filho adolescente da primeira mulher, que voltou ao seu país africano de origem após o divórcio, e que ficou sob custódia da avó depois de o pai ter sido preso. Jean era já amigo de François quando Sara ainda vivia com ele. E é precisamente com François que ele vai abrir uma agência para formação de jogadores de râguebi das categorias mais jovens. Não parece ser lá muito boa ideia, e confirma-se que não, quando Sara, que não vê François há vários anos, volta a cruzar-se com ele por causa do negócio em que este e Jean são agora sócios. Fica bastante perturbada e acaba por voltar a envolver-se com o antigo amante. E é a vez de a raiva entrar em cena.

Com Amor e com Raiva é mais uma variação sobre o tema do triângulo amoroso, em que Claire Denis trabalha sobre a contradição entre a fidelidade e o desejo. Sara começa por mentir a Jean e dizer-lhe que não esteve com François, mas perante a cólera dele, admite que sim e que faltou à verdade, enquanto lhe jura que o ama. E parece ser tão sincera na admissão da culpa como nas juras de amor. Só que, da caracterização das personagens (sobretudo o esquemático François) aos enredos secundários (o problemático filho de Jean), fica tudo muito pela rama neste psicodrama amoroso ambientado em território da pequena burguesia urbana, que conta com uma banda sonora insistentemente ominosa dos Tindersticks, mais apropriada para um filme policial do que para a história de um casal em desagregação.

Se a intenção da realizadora era que, mesmo apesar da sua duplicidade, inconsistência emocional e obsessão por um homem com o qual reconheceu ter tido uma má experiência amorosa, os espectadores compreendessem o comportamento de Sara, não foi conseguida. Porque o mais natural é estarmos do lado do infeliz Jean, que está a reconstruir a vida a pulso e a voltar a encaixar-se na sociedade, ao mesmo tempo que tenta encaminhar um filho que atravessa a pior fase da adolescência, contando com o apoio e o amor de Sara para levar tudo a bom porto. O que Jean tem de decente, tem Sara de insofrível, e são (apenas) estes dois retratos de amantes dilacerados e irremediavelmente desavindos o que acabamos por levar de Com Amor e com Raiva.

Escrito por
Eurico de Barros
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