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Como Cães Selvagens

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A Time Out diz

3/5 estrelas

Sexo, drogas e crime é o credo dos três bandidos de meia-tijela desde filme, mas afinal o que eles querem é o "dolce far niente" de uma boa vida pós-criminal

Bandido que é Bandido que se preze não quer ser criminoso para a vida. Como a maioria dos trabalhadores também 
o meliante consciente anseia por uma reforma confortável que o leve para um lugar qualquer com sol, areia, mar, gajas boas... E sem tratado de extradição. Troy (Nicolas Cage, por uma vez em modo
bom actor sem sobre-representação nem nada e ainda com o bónus de uma cómica imitação de Humphrey Bogart) está 
nessa. Pois acabou de sair da prisão sem qualquer vontade de voltar, mas também sem qualquer inclinação para um trabalho honesto. Precisa, portanto, até por ser um romântico, de um golpe a sério, isto é, do mítico trabalhinho final gerador de proventos para a vida com que todo o pequeno e médio ganguester sonha.

O protagonista do filme de Paul Schrader (argumentista de Taxi Driver e O Touro Enraivecido, realizador de Mishima, American Gigolo ou O Acompanhante, e mais um par de filmes estimáveis embora de qualidade irregular) tem muita conversa – que é, pensa ele, a sua especialidade. É assim que convence Cão Raivoso (Willem Dafoe), um psicótico aditivado por cocaína, que logo na primeira cena limpa o sebo a uma amante contrariada e à sua filha adolescente, e o brutamontes Diesel (Christopher Matthew Cook), um tipo capaz de fazer mal só porque sim, a alinharem no rapto do filho bebé de um malandro que cometeu o erro de ficar a dever a um malandro maior do que ele.

Raptar uma criança começa por ser um problema ético (pois não é por serem niilistas que uns celerados perdem a moral), rapidamente ultrapassado pela perspectiva de férias permanentes em paraíso tropical. Antes de se tornar no maior pesadelo deste trio de facínoras de pavio curto e a dar para o paspalhão.

O subtil sarcasmo que o realizador introduz na construção desta tragicomédia, como quem fornece uma visão interior da vida de bandidagem através do argumento de Matthew Wilder (por sua vez inspirado no romance do criminoso tornado escritor policial Edward Bunker), é a sua mais-valia. Isso e a forma habilidosa, ocasionalmente ardilosa mesmo, como representa plasticamente, quer a violência descabelada de que são capazes as personagens, como 
as emoções – entre elas a lealdade – deste trio de mânfios, ou os seus esquinados raciocínios assentes em filosofia de cordel e egoísmo em estado puro.

Schrader, contudo, embora enuncie uma estética, às tantas, sem de todo a abandonar, parece determinado em amaciá-la, torná-la mais conforme à regra. O que só confirma a sua falta de chama na concretização da acção, a ausência de chispa que deixa a sua obra, ou pelo menos parte dela, apenas 
à beira da relevância, incapaz de ousar o passo em frente.

Não é por isso que cabeças deixam de rebentar mesmo à nossa frente. No entanto, o universo que criava como
 um submundo sórdido, vivido em clubes
 de strip e motéis escalavrados pela má frequência, dominado por um desejo de fuga assente em demasiada auto-estima
 e um optimismo, como quase todos, baseado mais na boa vontade do que nos factos da vida, começa a desmoronar-se como um edifício mal construído. O que é ampliado pelas constantes e desnecessárias referências ao cinema policial clássico, que, decerto, farão as delícias de muitos cinéfilos (principalmente se reunidos para um dos seus pedantes exercícios de Trivial Pursuit cinematográfico), mas constituem, de facto, um desperdício narrativo quando tudo parecia correr pelo melhor.

Por Rui Monteiro

Escrito por
Rui Monteiro

Detalhes da estreia

  • Classificação:18
  • Data de estreia:sexta-feira 18 novembro 2016
  • Duração:91 minutos
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