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Decisão de Partir

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Decision to Leave
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A Time Out diz

O novo filme de Park Chan-woo é um policial e um elemento de frustração para quem admira o cinema do realizador sul-coreano.

Já há bastantes anos que o sul-coreano Park Chan-wook não realizava um policial, e Decisão de Partir vê-o de regresso ao género, após Stoker (2013), que o realizador da ‘Trilogia da Vingança’ e A Criada foi rodar ao Ocidente. E tal como Chan-wook gosta de fazer aos géneros cinematográficos tradicionais, Decisão de Partir é um policial com uma voltinha na ponta, um filme que à primeira vista se apresenta como um thriller ao jeito clássico, mas que a certa altura das suas quase duas horas e meia de duração, revela ser, na realidade, a história de uma obsessão amorosa que se serve da matriz do policial para se manifestar.

Hae-joon (Park Hae-il) é um polícia zeloso e dedicado que tem sérios problemas de sono. Vive e trabalha em Busan e ao fim-de-semana vai ter com a mulher, que trabalha numa central nuclear noutra cidade, Ipo. O seu casamento não é feliz, porque caiu numa rotina, agravada pela ausência de Hae-joon durante a semana. Um dia, um homem de negócios amante de montanhismo morre no que parece ser um acidente durante uma escalada. O polícia e o seu jovem assistente viram-se para Seo-rae (Tang Wei), a jovem mulher chinesa do morto, que faz voluntariado com pessoas idosas e parece muito pouco afectada pela morte do marido, o que a torna ainda mais suspeita aos olhos dos agentes da lei.

Hae-joon começa a vigiar a jovem, acabando por se tornar visita de casa, de cozinhar para ela e de receber massagens que o ajudam a combater a sua insónia. Seo-rae não fala muito bem coreano, o que faz que ambos recorram às apps de tradução dos seus telemóveis para conseguirem comunicar com mais clareza. E esta dificuldade de comunicação entre o polícia e a suspeita pela qual ele se sente cada vez mais atraído (um sentimento que, aparentemente, parece ser retribuído) é espelhada pela dificuldade que o próprio filme tem em comunicar com os espectadores através da forma de contar a história escolhida por Park Chan-wook: convoluta em vez de linear, serpenteante ao invés de em linha recta.

Há alturas de Decisão de Partir em que, se estivéssemos a ver o filme em casa em DVD, premíamos o botão Rewind, de tão desconcertados que ficamos com a névoa de percepção que envolve a narrativa. Se a intenção de Chan-wook era fazer-nos partilhar a ambiguidade de Hae-joon em relação ao que a enigmática Seo-era poderá (ou não) sentir por ele, e ficarmos indecisos sobre se esta está apenas a manipular o polícia ou também se sente atraída por ele, então não foi muito competente a fazê-lo, porque nos sentimos mais confusos do que intrigados pelo que está a ser narrado. E isto tem também como consequência retirar intensidade emocional e atenuar a voltagem erótica ao filme.

Decisão de Partir tem várias sequências muito bem conseguidas, e alguns achados visuais (ver os planos do ponto de vista dos olhos dos assassinados, como o do homem de negócios que caiu do penhasco, com formigas a andarem-lhe nas órbitas). O que falha mesmo no filme é a capacidade de Chan-wook para dar espessura de construção e plausibilidade à prova de bala a um enredo complexo e com reviravoltas a mais (sem falar nas distracções laterais, como o episódio dos ladrões de tartarugas), todas relacionadas com o comportamento inverosímil de Seo-rae, que acaba por sabotar o ambiente e a credibilidade desta história de amor obsessivo em formato de policial. E deixar o espectador – e sobretudo o apreciador do cinema de Chan-wook – mais frustrado do que satisfeito.

Escrito por
Eurico de Barros

Elenco e equipa

  • Realização:Park Chan-Wook
  • Argumento:Park Chan-Wook, Seo-kyeong Jeong
  • Elenco:
    • Tang Wei
    • Go Kyung-Pyo
    • Park Hae-Il
    • Lee Jung-Hyun
    • Yong-woo Park
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