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No Verão Passado

  • Filmes
Last Summer
Photograph: Cannes International Film Festival
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A Time Out diz

O regresso à realização de Catherine Breillat, após um silêncio de uma década, gira em redor da relação íntima entre uma madrasta e o seu enteado adolescente.

Há dez anos que Catherine Breillat não realizava um filme, desde Abus de Faiblesse (2013). E a julgar por No Verão Passado, o tempo não foi benéfico para a sua reputação de cineasta provocadora, que por vezes estica até ao limite a apresentação de temas delicados ligados às relações íntimas ou familiares e à sexualidade, sobretudo a feminina. Este No Verão Passado é um remake do thriller erótico dinamarquês Rainha de Copas, de Mey El-Thouky (2019), sobre uma advogada especializada em defender vítimas de violação que se envolve sentimentalmente como seu enteado adolescente, pondo a vida familiar e a sua carreira em risco.

Breillat transpôs a história para a França rural, dando a Léa Drucker o papel de Anne, uma advogada que trata de casos de menores, casada com um rico empresário, Pierre (Olivier Rabourdin) que pára pouco tempo em casa. O casal tem duas filhas adoptivas pequenas, ambas asiáticas, a que se lhes junta um dia Théo (Samuel Kircher), o filho adolescente e problemático do primeiro casamento de Pierre, que vivia na Suíça com a mãe e esta já não conseguia aturar. Apesar de ser Verão, Pierre anda sempre fora em negócios e Anne passa muito tempo com as duas meninas e com o macambúzio e insolente Théo, que um dia chega ao ponto de roubar coisas em casa e simular que foi um assalto. Mesmo assim, madrasta e enteado acabam na cama.

Como se não bastasse a No Verão Passado a definição psicológica das personagens principais ser muito esquemática, Catherine Breillat também não é capaz de suspender a descrença do espectador e fazê-lo acreditar naquela relação entre um adolescente antipático e a pedir um par de estalos a todo o pé de passada, e uma mulher vivida e madura cujo trabalho, ainda por cima, tem a ver com situações envolvendo menores. Não há nada ali que encaixe, e a sugestão que Anne poderá sentir-se frustrada com as constantes ausências do marido, e a sua atracção por Théo seja puramente carnal, apenas motivada pela satisfação dos desejos sexuais, é uma pobre e pífia explicação. (Isto apesar de Anne manifestar alto e bom som o seu prazer nas cenas de sexo.)

Depois, Breillat não elabora quase nada em termos de narrativa ou efeitos dramáticos sobre a melindrosíssima situação íntima que se criou entre madrasta e enteado, ficando-se pelo estafado lugar-comum da “hipocrisia burguesa”, quando Théo acaba por contar ao pai o que se passou, o que Anne nega a pés juntos para defender o seu status quo familiar e social, e a sua posição profissional, dizendo que o rapaz mente com quantos dentes tem, o que leva à sua saída de casa. O recurso de Théo a um advogado para obrigar Anne a admitir a relação e não passar por mentiroso não dá em nada, e o último encontro entre ambos, que a realizadora pretende que seja perturbador e lancinante, redunda francamente ridículo.

Catherine Breillat podia ter levado a história pelos caminhos do thriller, do drama de família em ambiente burguês ao jeito de Claude Chabrol, ou então da tragédia de amour fou inexplicável e funesto. Mas No Verão Passado acaba por não ir a lado nenhum e termina “pendurado” e num irritante e insatisfatório anti-clímax. Nem escaldante nem intenso, este estio de sexo ao arrepio das convenções sociais é, isso sim, tépido e enfadonho.

Escrito por
Eurico de Barros

Elenco e equipa

  • Realização:Catherine Breillat
  • Argumento:Catherine Breillat, May el-Toukhy, Maren Louise Käehne
  • Elenco:
    • Léa Drucker
    • Olivier Rabourdin
    • Clotilde Courau
    • Samuel Kircher
    • Angela Chen
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