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O Filho

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The Son
Photograph: Venice Film Festival
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A Time Out diz

Florian Zeller desilude profundamente com este novo filme passa-se no território da família. Como o premiado e aclamado ‘O Pai’, adapta ao cinema uma peça sua.

Depois do oscarizado O Pai (2020), com Anthony Hopkins no papel de um homem cuja doença degenerativa lhe está a baralhar a percepção da realidade, o dramaturgo e realizador francês Florian Zeller filma, em O Filho, outra das suas peças de teatro dedicadas à família, voltando a assinar o argumento com o seu colega inglês Christopher Hampton. Hugh Jackman interpreta Peter Miller, um bem-sucedido advogado nova-iorquino que se prepara para iniciar uma carreira na política. Peter está divorciado da primeira mulher, Kate (Laura Dern), de quem tem um filho com 17 anos, Nicholas (Zen McGrath). Entretanto, casou-se de novo, com Beth (Vanessa Kirby) e tiveram um bebé.

Quando tudo parece ir de vento em popa, Kate entra em contacto com o ex-marido e diz-lhe que Nicholas anda a faltar às aulas, está profundamente deprimido, quase não fala com ela e só sente hostilidade da parte do rapaz, pedindo a Peter que o receba em casa por algum tempo. Este não pode recusar, tal como a mulher não lhe pode dizer que não, e Nicholas instala-se com o pai, a madrasta e o meio-irmão. Mas apesar da mudança de ambiente e de companhia, o rapaz continua sorumbático, ensimesmado, monossilábico e esquivo, e quando o pai lhe pergunta o que é que ele tem, Nicholas só responde que está “a sofrer”. E o ambiente vai ficando cada vez mais pesado.

Em O Pai, Florian Zeller instalava-nos no ponto de vista da personagem de Anthony Hopkins e tirava o máximo partido emocional dessa partilha, mostrando-nos quer a aflição e a impotência dos familiares perante a degradação mental do octogenário, quer o seu lento e lancinante afastamento do mundo, das pessoas e da sua própria identidade.

Aqui, Zeller não tem uma âncora dramática tão forte e angustiante como a do filme anterior, e fica muito distante dos picos de emoção de O Pai, saltando de situação feita em situação feita e tendo muita dificuldade em fazer-nos acreditar naquelas pessoas (a começar por Nicholas, estereótipo do adolescente privilegiado e “incompreendido”, e a pedir um valente par de galhetas), na sua caracterização emocional e mental, e na forma como se relacionam e comportam (as personagens, tal como o filme, têm um défice de bom senso e da mais básica verosimilhança: ver a arma de caça – carregada! – que Peter tem em casa e da qual não se vê livre antes de acolher Nicholas).

Tudo em O Filho é adivinhável, transparente e telegrafado por antecedência (ainda o filme vai a meio e já comunicou desajeitadamente ao espectador como é que vai acabar), de uma falta de subtileza chapada (ver a relação difícil de Peter com o pai – uma breve participação de Anthony Hopkins, cuja mera presença atira logo a fita para outro patamar de intensidade – que se repercute naquela que ele tem com Nicholas, mais um cliché de babar na gravata) e coberto por um espesso molho de psicologia pronta-a-usar.

Os flashbacks para os tempos felizes da infância de Nicholas mais parecem anúncios a destinos turísticos paradisíacos, Hugh Jackman (que também é um dos produtores) anda a apanhar bonés, espartilhado como está numa personagem unidimensional, o argumento dá muito pouco que fazer a Laura Dern e Vanessa Kirby, e o Nicholas de Zen McGrath é uma pobre caricatura ambulante do teenager em crispação íntima extrema. Talvez seja melhor que Florian Zeller e Christopher Hampton nos poupem a A Mãe, a outra peça deste conjunto passado no melindroso território da família nuclear.

Escrito por
Eurico de Barros

Elenco e equipa

  • Realização:Florian Zeller
  • Argumento:Christopher Hampton
  • Elenco:
    • Hugh Jackman
    • Vanessa Kirby
    • Laura Dern
    • Zen McGrath
    • Anthony Hopkins
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