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Os Delinquentes

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Os Delinquentes
DROs Delinquentes
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A Time Out diz

3/5 estrelas

Parece um thriller, mas não é. Este peculiar filme do argentino Rodrigo Moreno segue por caminhos inesperados e a sua coerência interna é inatacável.

Realizado pelo argentino Rodrigo Moreno, Os Delinquentes abre com aquele que é talvez o mais banal e anti-espectacular roubo de um estabelecimento bancário da história do cinema. Moran (Daniel Elias) trabalha há anos como caixa num banco de Buenos Aires. Um dia, mete 350 mil dólares numa mochila, após ter levado uma considerável soma das caixas para a zona da caixa-forte e dos cofres, como faz habitual e mecanicamente há muito tempo. Este banalíssimo desvio de dinheiro dá o mote para o que vai acontecer a seguir, ao longo das três horas de duração de Delinquentes, um falso thriller em que a digressão se substitui à acção, e o anti-clímax ao suspense.

A seguir a ter roubado o banco, Moran marca encontro com o seu colega Román (Esteban Bigliardi) num bar das redondezas, e faz-lhe uma proposta singular, com a mochila repleta de dinheiro aos pés. Vai confessar o assalto e entregar-se à polícia no campo, longe de Buenos Aires, calculando que, com bom comportamento, sairá da cadeia três anos e meio depois (o que prefere a passar mais 20 anos no banco). Román ficará a zelar pelo dinheiro, que é suficiente para ambos se reformarem a seguir. E Román não pode recusar ou denunciar Moran, senão este dirá que o colega era seu cúmplice, e irá também parar à cadeia. Román não tem outro remédio senão esconder o dinheiro em casa, que partilha com a namorada, uma professora de música.

Há muito mal-estar no banco e é aberto um inquérito ao roubo, durante o qual uma investigadora se farta de pressionar Román, tal como o seu superior hierárquico, não conseguindo, no entanto arrancar-lhe nada ou provar o seu envolvimento; e Moran vê-se obrigado a pagar a outro recluso, Garrincha, que controla a prisão, para ter uma vida protegida e sossegada lá dentro, já que se não o fizer acaba morto. É nessa altura que Román descobre que o antigo colega tem mais dinheiro escondido, algures no interior do país, porque é ele que o tem que ir buscar, para o depositar na conta de Garrincha.

É então que Delinquentes começa a seguir por outros caminhos, a afastar-se cada vez mais da história principal, a privilegiar um surrealismo muito suave e a dar leves cotoveladas borgesianas. Os nomes de grande parte das personagens são anagramas uns dos outros (há, por exemplo, uma Norma e uma Morna), o actor que faz o papel do chefe de Moran e Román (Germán De Silva) é o mesmo que personifica Garrincha, e temos também as coincidências: Moran e Román, sem o saber, apaixonam-se pela mesma mulher em alturas diferentes. E, na cadeia, as ameaças dão lugar à poesia. Rodrigo Moreno faz também referências a filmes do seu compatriota Hugo Fregonese e a Robert Bresson, e a um célebre rocker argentino, o que lhes deverá dizer muito.

Esta deriva excêntrica é levada pelo realizador até às suas últimas consequências, e o final deixará perplexo – ou mesmo desagradado – quem estava à espera de uma resolução limpa, lógica, com explicações dadas e todas as pontas bem atadas. Mas Delinquentes, embora a princípio pareça, não é esse tipo de filme, e a verdade é que a sua peculiar coerência interna é inatacável. O cinema também precisa destas fitas idiossincráticas. E julgando por títulos como La Flor, Trenque Lauquen e este Delinquentes, que pertencem todos à mesma “família”, o cinema argentino é fértil neles.

Escrito por
Eurico de Barros

Elenco e equipa

  • Realização:Rodrigo Moreno
  • Argumento:Rodrigo Moreno
  • Elenco:
    • Esteban Bigliardi
    • Daniel Elías
    • Margarita Molfino
    • Germán de Silva
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