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Estrada Nacional 2
© Joao Silva

Paragens obrigatórias entre Chaves e Vila Real

Os primeiros 62 km da EN2 são para fazer com calma. Por três motivos: para desfrutar dos primeiros pedaços deste alcatrão cheio de histórias, pelas curvas e contracurvas que se repetem, e pelo caminho e muitos motivos para parar

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Um périplo-postalinho por Chaves tem de incluir uma passagem pela Ponte de Trajano, construída pela sétima legião (de romanos, não a banda de “Por quem não esqueci”) e que resiste até aos dias de hoje como testemunho da extrema competência desse império na área das obras públicas. A ponte atravessa um Tâmega airoso, domesticado, que parte a cidade ao meio.

Na margem Norte, o centro histórico, a Sul o Jardim Público. A flora deste pequeno e tranquilo parque parece determinada a estragar o dia a todos aqueles que são alérgicos ao pólen. As outras pessoas todas podem aproveitar para dar um passeio. Já agora, o marco do Km 0 da EN2 fica mesmo ao ao lado. 

O centro histórico de Chaves parece o modelo a partir do qual se fizeram todos os centros históricos portugueses: há um castelo no ponto mais alto com a indispensável torre de menagem, um pelourinho, uma igreja matriz (esqueça: a Igreja da Misericórdia é mais bonita) e os Paços do Concelho. O que há de mais particular na cidade, para além de um intrigante número de croissanterias, são as suas casas coloridas, com varandas de madeira empoleiradas para a rua. É essencial passear pela Rua Direita e artérias adjacentes para sentir o coração da cidade velha pulsar. A estrada nacional enquanto ponto de atracção turístico é pouco ou nada explorado na cidade. No posto de turismo não havia qualquer mapa, guia ou roteiro, mas não faltavam folhetos para explicar aos estrangeiros como pagar as SCUT.

Paragens obrigatórias entre Chaves e Vila Real

  • Museus
  • Arte e design

Nadir Afonso foi um dos pintores mais originais do século XX português, mas a sua formação foi em arquitectura. Antes de se dedicar a 100% às telas e aos pincéis trabalhou com nomes como Le Corbusier e Oscar Niemeyer, por isso é uma homenagem justa que a) tenha um museu em nome próprio; b) que esse museu seja desenhado por um dos melhores arquitectos portugueses de sempre: Siza Vieira. O edifício por si só vale uma visita, mas vale a pena passar umas horas a admirar a pintura de Nadir Afonso (Arquitectura sobre Tela, exposição permanente) ou uma das exposições temporárias.

  • Hotéis

Quando foi construída, em meados do século XVII, a Quinta da Mata tinha propósitos muito práticos – trabalhar a terra, sobreviver. O edifício, um solar rural com capela e fachada de granito, mudou de vocação em 1993 e é desde então uma referência turística na zona. Serve também de quartel-general para muitos viajantes, sobretudo estrangeiros, que estão prestes a partir para a aventura da Estrada Nacional 2. O anfitrião, Luís Moreira, é um entusiasta da estrada, da natureza e de tudo o que há em Trás-os-Montes – incluindo os vinhos, dos quais é grande conhecedor (fique atento à garrafeira, no rés-do-chão, e deixe-se guiar pelas sugestões de Luís). Se tiver a sorte de o encontrar por lá pode dar por si a passar horas a ouvir histórias da quinta, daquela zona e do que por lá se faz. Uma visita guiada informal pela horta e pelos jardins da quinta foi uma autêntica lição sobre agricultura biológica e sustentabilidade. Os seis quartos da Quinta da Mata são de decoração simples, à qual se aplica também o adjectivo “rústico”, que está muito gasto, coitado, mas que se adapta bem aqui. O pequeno-almoço inclui, como não podia deixar de ser, pastéis de Chaves. Umas maravilhas folhadas feitas pela fresca que vamos lamentar não termos para sempre na primeira refeição do dia.

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O que tem mesmo de provar: o mítico pastel de Chaves
DR

O que tem mesmo de provar: o mítico pastel de Chaves

Esta meia lua estaladiça é uma espécie de embaixada gastronómica. Está à venda um pouco por todo o país, mas os melhores – os genuínos – estão na cidade que os inventou. O melhor sítio para os comer, dizem-nos, é a Pastelaria Maria (Largo do Município, 5). Esta pequena loja junto ao castelo faz mais de 400 pastéis por dia (0,60€ cada!), além do típico folar. É descer os degraus desta bonita casa cor-de-rosa de porta azul e ver se há uma fornada acabada de sair. Também pode comprar pastéis congelados e fazer em casa, tornando-se assim o co-autor não-oficial desta iguaria. O debate sobre qual o melhor pastel de Chaves é longo e complexo, mas em todas as discussões costumam ouvir-se três nomes: a supracitada Pastelaria Maria, o café D’Chaves (Largo 8 de Julho, 14) e a pastelaria Mil Doce (Largo 8 de Julho, 19). Faça você mesmo o roteiro dos pastéis e eleja o seu preferido com toda a objectividade (e todo o colesterol). O pastel de Chaves é um produto com Identificação Geográfica Protegida desde 2015. Isto significa que o autêntico pastel deve ser feito na cidade que lhe deu nome, com um conjunto de ingredientes e métodos que respeitem a tradição. Neste momento há apenas 8 produtores certificados.

  • Hotéis
  • Hotéis com spa
  • Grande Porto

Aqui, um quarto em época alta custa mais de 200€ por noite, mas andar a passear pelos jardins do Vidago Palace é uma coisa que não tem preço. É grátis. O lindíssimo edifício de 1910, renovado 100 anos depois por Siza Veira, merece ser admirado por fora – e só por fora. Um pequeno passeio pelos jardins fazem-nos sentir que pertencemos a uma espécie de nobreza que encara o termalismo como uma grande necessidade, e os jardins botânicos em miniatura um elemento decorativo essencial: magnólias, plátanos, cameleiras, azevinho, pinheiros ou alfazemas, lagos e fontes de água ter- mal compõem o cenário. Destaque para o pequeno chalé à esquerda do edifício principal, edifício que é, sem sombra de dúvidas, o WC mais bonito de Portugal. A fonte de água do Vidago está aberta de Maio a Outubro, das 08.00 às 19.00, hora em que também fecha o jardim.

Vidago Palace Hotel, Parque de Vidago, um pequeno desvio perto do km 17 da EN2.

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Ainda pela estrada fora: Pedras Salgadas Spa & Nature Park
  • Hotéis
  • Hotéis com spa
  • Grande Porto
  • preço 3 de 4

As qualidades das águas deste parque são conhecidas desde pelo menos o século XIX – e muito familiares para todos os portugueses que já tiveram uma digestão mais complicada – mas é a partir de 2009, quando renasce como spa termal pelas mãos de Siza Veira que ganha uma nova vida. A fama internacional chegou em 2012 quando as tree houses (casas entre as árvores desenhadas por Luís Rebelo de Andrade e Diogo Aguiar) foram eleitas Edifício do Ano para o Archdaily, site de referência mundial no campo da arquitectura. As casas, que fazem parte do complexo turístico Pedras Salgadas Spa & Nature Park são o mais próximo que vamos conseguir de dormir num ninho de árvore (uma noite anda à volta dos 200€). O parque tem ainda uma Casa de Chá, um antigo Casino que recebe agora eventos e, é claro, fontes de água termal onde pode provar directamente da natureza a água das famosas garrafinhas verdes.

Parque Pedras Salgadas, Bornes de Aguiar, um pequeno desvio perto do km 32 da EN2.

Três hotéis termais em Portugal para ficar de molho

Fora da estrada
DR

Fora da estrada

Ecopista do Corgo

Os comboios pararam de passar na Linha do Corgo e foram substituídos por bicicletas. Os carris deram lugar a uma passadeira de cimento que acompanham as voltas do Rio Corgo.

Parque Natural de Alvão e Barragem do Alvão

É um dos vários parques naturais que estão à beirinha da EN2. O do Alvão é famoso, entre outras coisas, pela cascata de Fisgas de Ermelo e pelas aldeias de xisto de Lamas de Olo e Ermelo.

Siga caminho

  • Coisas para fazer

Eis-nos chegados à capital de Trás-os-Montes e Alto Douro, cidade que o nosso GPS insiste em confundir com Vila Real de Santo António, uns quilometrozinhos mais a Sul. Foi deste sítio à beira do rio Corgo que saiu Diogo Cão, o navegador pioneiro a estabelecer relações com o reino do Congo, em mais um momento enternecedor de geografia. A Casa Diogo Cão (Rua Irmã Virtudes, 4) fica no centro de Vila Real. É uma casa típica da segunda metade do século XV que foi resistindo à passagem do tempo, dando-nos, hoje, uma oportunidade rara para perceber como eram as casas típicas daquele tempo. E não, não há nenhum veterinário em Vila Real com o mesmo nome. Diogo Cão pode ter descoberto a foz do rio Zaire, sim senhor, não está mau, mas não descobriu o que acontece ao juntar amêndoas, ovos e açúcar numa massa em forma de crista de galo como fez a Casa Lapão (Rua da Misericórdia, 64). Esta pastelaria especializada em doçaria conventual arranjou a sua própria maneira de dar novos mundos ao mundo – criando ou divulgando especialidades únicas como as já citadas cristas de galo, os toucinhos do céu, os pitos de Sta. Luzia (é massa quebrada com abóbora e canela, não sejam porcos) e os antoninhos (uns pastéis de doces de ovos e gila). É um lugar essencial para todas aquelas pessoas que querem ver o sangue nas suas veias cristalizar. Se comprou umas calças muito largas e não quer gastar dinheiro num cinto, também pode passar aqui uma tarde a provar estas especialidades. Mas o ex-líbris de Vila Re

  • Coisas para fazer

Diz-se de Viseu que é a cidade do país com mais rotundas. O mito é tal que há quem acrescente que os moradores da zona têm de trocar os pneus do carro com regularidade, porque estes ficam gastos de tanto curvar à esquerda. Se não se entusiasma com a ideia de contornar dezenas de circunferências no meio do alcatrão, não desespere. A cidade tem outros pontos de interesse. A começar pelo Museu Grão Vasco, no centro histórico de Viseu, um dos museus mais antigos do país, que alberga uma impressionante colecção de arte sacra composta sobretudo por obras do pintor quinhentista Vasco Fernandes – o tal Grão Vasco. Se não é fã de arte sacra, fique a saber que há também peças de porcelana, mobiliário, escultura, joalharia e numismática para ver. Faça aquele jogo de fingir que está no Ikea a comprar móveis para a casa e comente assim os hostiários e os aparadores: “Isto deve dar uma grande chatice para limpar”. A Sé Catedral fica mesmo em frente ao museu, pelo que o pacote Viseu Turismo Religioso pode ser cumprido rapidamente. Se sobrar tempo, dê um passeio pelo centro histórico – a cidade está a investir bem em esplanadas – e vá até à Casa do Miradouro ver como eram os grandes investimentos do imobiliário no século XVI.

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  • Coisas para fazer

A Estrada Nacional embrenha-se pela Sertã adentro. Perdemos-lhe o rumo, andamos às voltas, mas se existe um bom sítio para andar perdido esta vila é um deles. Tem um castelo, uma igreja matriz, uma ponte filipina, uma praça com um coreto e uma ribeira, elementos que facilitam a vida a qualquer pessoa a precisar de indicações. Por estar no centro do país, quase a meio da EN2, muito perto do Zêzere e próxima de várias Aldeias de Xisto, a Sertã é uma base perfeita para explorar o interior português. E para descansar depois de fazer muitos quilómetros.

  • Coisas para fazer

Antes de se fazer à estrada, impõe-se uma volta demorada pelo centro histórico de Montemor-o-Novo, uma passagem pelas ruínas do castelo, uma vista de olhos ao Santuário da Nossa Senhora da Visitação e ao Chafariz da Vila. Mas grande parte da riqueza de Montemor está nos seus monumentos megalíticos: há antas e menires capazes de fazer Obelix salivar. Os Menires da Pedra Longa e a Anta-Capela de Nossa Senhora do Livramento merecem uma visita. Beba uma bica antes de se agarrar ao volante porque terá pela frente uma série de rectas soporíferas.

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